Gustavo Heidrich
Crianças chorando e pais ansiosos. Esse é o cenário que se vê todo início de ano nas portas de creches e pré-escolas. O momento é tenso para eles e também para o professor, que, sem a exata compreensão sobre o que se passa com os pequenos, tenta a qualquer custo fazer com que eles se sintam à vontade no novo ambiente.
Para o coordenador pedagógico, as últimas semanas do ano ou a primeira antes do início das aulas são momentos ideais para ajudar a equipe a se preparar para essas situações. Um bom caminho é, nas reuniões de formação, promover discussões para derrubar alguns mitos que rondam o período de adaptação. Por isso, elegemos cinco ideias que caíram no senso comum e certamente estão na cabeça dos professores para que se tornem pauta dos encontros. Com as informações sobre os mitos que estão a seguir, será possível desconstruí-los, mostrando o que acontece com as crianças. Dessa forma, os professores terão mais segurança ao agir e certamente terão mais sucesso na integração da criança à escola sem traumas.
Débora Rana, coordenadora pedagógica da Escola Projeto Vida, em São Paulo, explica que, ao sair do ambiente familiar, a criança aos poucos deixa a fase de anomia, que é o desconhecimento das regras sociais, e passa para a heteronomia, ou seja, começa a reconhecer as normas de convívio, mas ainda não as incorpora. A adaptação, portanto, nada mais é do que uma passagem bem marcada da primeira para a segunda fase. "O processo é demorado e somente ao longo da vida ela chega à autonomia, tornando-se responsável pelos seus atos."
Já para os pais, o momento é mesmo de nervosismo e apreensão: "Eles ainda não têm total confiança na escola e precisam de informações para se sentirem seguros", afirma Cisele Ortiz, formadora do Instituto Avisa Lá, em São Paulo. É preciso saber lidar com os familiares, pois eles são importantes no processo de aprendizagem. Cabe ao coordenador pedagógico intermediar a relação entre a escola e os pais, suprindo-os com os dados necessários sobre a rotina e a interação dos filhos com as propostas pedagógicas.
Mito 1
Criança que não compartilha brinquedos não está adaptada
"Você tem de dividir o brinquedo com seu amiguinho." "Isso não é seu, empreste para ele." Frases como essas são comuns em uma sala de Educação Infantil. Para a criança, muitas vezes, elas podem soar como uma ordem, uma obrigação, causando choro e recusa. "Aos olhos dos adultos, a negação da criança em dividir é vista como egoísmo", esclarece Débora Rana. Criar uma situação ameaçadora, aumentando o tom de voz ou sugerindo uma punição caso a criança não divida ou colabore com um colega, não é o caminho.
O que acontece
Nos primeiros anos de vida, a criança encontra-se num momento autocentrado do seu desenvolvimento e desconhece as regras de convivência social. A compreensão do sentido e do prazer de compartilhar virá posteriormente, depois de um processo mais amplo de reconhecimento do outro.
Como orientar os professores
Nas reuniões de formação, leve referências teóricas sobre as fases de desenvolvimento das crianças e seus comportamentos, como os estudos do educador francês Jean Piaget (1896-1980). O trabalho com estratégias de partilha e colaboração pode ser facilitado se o professor for orientado a montar em sala grupos menores, com duas ou três crianças, e a promover combinados - como o de que a criança pode ficar com um brinquedo por certo tempo, mas que depois deve cedê-lo ao colega. Agir de maneira firme e ao mesmo tempo acolhedora, a fim de mediar os conflitos e não negá-los ou resolvê-los de forma impositiva, é outra dica. Na hora do impasse, o ideal é expor o conflito e descrever para a criança as consequências de querer o objeto só para ela. Além disso, incentivar que elas verbalizem o que estão sentindo e encontrem soluções em conjunto ajuda no processo de mudança de atitude.
Como orientar os professores
Nas reuniões de formação, leve referências teóricas sobre as fases de desenvolvimento das crianças e seus comportamentos, como os estudos do educador francês Jean Piaget (1896-1980). O trabalho com estratégias de partilha e colaboração pode ser facilitado se o professor for orientado a montar em sala grupos menores, com duas ou três crianças, e a promover combinados - como o de que a criança pode ficar com um brinquedo por certo tempo, mas que depois deve cedê-lo ao colega. Agir de maneira firme e ao mesmo tempo acolhedora, a fim de mediar os conflitos e não negá-los ou resolvê-los de forma impositiva, é outra dica. Na hora do impasse, o ideal é expor o conflito e descrever para a criança as consequências de querer o objeto só para ela. Além disso, incentivar que elas verbalizem o que estão sentindo e encontrem soluções em conjunto ajuda no processo de mudança de atitude.
Mito 2
Criança adaptada é extrovertida e participativa
O que acontece
Existem as crianças extrovertidas, como também as tímidas. O respeito à personalidade de cada uma é essencial para o processo de adaptação e o direito à timidez precisa ser assegurado.
Como orientar os professores
As estratégias para integrar as crianças devem ser procuradas pelo conjunto de educadores - e, certamente, com a ajuda dos pais. Para tanto, uma entrevista do coordenador pedagógico com os familiares sobre as preferências dos filhos é fundamental. Esse material será cruzado, durante a formação, com os registros de classe, relatórios de adaptação e portfólios. O que está sendo proposto atende às necessidades da criança? É possível também fazer visitas à sala ou gravar vídeos para perceber as práticas que funcionam melhor para cada criança e para o grupo.
Mito 3
Na Educação Infantil, todos precisam ser amigos
O que acontece
No período de adaptação, primeiro há a criação do vínculo para que o trabalho escolar aconteça. Ele deve estar baseado no respeito entre as crianças e entre elas e os professores. Aos poucos - e naturalmente -, a afetividade vai sendo construída baseada nas afinidades dentro do grupo.
Como orientar os professores
Os educadores devem intervir apenas quando a amizade prejudica a participação nas atividades (por exemplo, quando uma criança só quer ficar com alguns colegas e se isola do coletivo). A professora precisa ser orientada a desenvolver um olhar atento sobre as situações ideais para explorar os gostos comuns em favor da aprendizagem. Nos encontros de formação, invista na criação de oportunidades para que os pequenos se apresentem e falem dos seus objetos preferidos e discuta as situações reais que acontecem em sala.
Mito 4
Quando estão integrados ao grupo, os pequenos não choram mais
O que acontece
"Essa manifestação é apenas um sintoma do desconforto da criança", afirma Débora Rana. Interpretar esse e outros sinais - como inapetência e doenças constantes - é fundamental durante a adaptação. O que eles significam? Por outro lado, a ausência do choro não quer dizer que a criança está necessariamente se sentindo bem: o silêncio absoluto pode ser um indicador de sofrimento.
Como orientar os professores
Uma criança que passa longos períodos chorando necessita de acompanhamento mais próximo. Na falta de auxiliares, ele pode ser feito pelo próprio coordenador até a criança se sentir mais segura. Ajuda também ter um plano para receber bem as crianças na primeira semana de aula. O uso de tintas, água e brincadeiras coletivas variadas é um exemplo de práticas atraentes que ajudam os pequenos a se interessar pelo novo espaço. Fazer com os professores uma orientação programada para que as crianças tragam objetos de casa - como fraldas, panos e brinquedos, que vão sendo retirados paulatinamente - auxilia a reduzir a insegurança.
Mito 5
A presença dos pais nos primeiros dias só atrapalha a adaptação
Na porta da sala, uma dezena de pais se acotovela querendo ver os filhos em atividade. A cena, pesadelo para muitos professores de Educação Infantil, que não sabem se dão atenção às crianças ou aos adultos, é representativa de um elemento essencial para que a adaptação aconteça bem: a boa integração entre a família e a escola, que deve acontecer desde o começo do relacionamento.
O que acontece
Nem todo pai ou mãe conhece as fases de desenvolvimento da criança e as estratégias pedagógicas usadas durante a adaptação. Eles têm direito de ser informados e essa troca é fundamental na transição dos pequenos do ambiente doméstico para o escolar. A ansiedade dos pais vai diminuir à medida que a confiança na escola aumenta - e isso só acontece quando há informações precisas sobre a trajetória dos pequenos.
Como ajudar os professores
É função do coordenador pedagógico acolher as famílias, fazer entrevistas para conhecer a rotina da criança e explicar o funcionamento e a proposta pedagógica da escola, além de estabelecer um combinado sobre a permanência dos pais na unidade durante a adaptação. Criar juntamente com os professores um guia de orientação para eles com dicas simples - como conversar com a criança sobre a ida à escola, a importância de levá-la até a sala e de chegar cedo para evitar tumulto - pode evitar problemas. Além disso, desenvolver um relatório de distribuição periódica, com informações sobre os progressos na aprendizagem e na socialização das crianças ajuda a aplacar a ansiedade dos pais.
Quer saber mais?
BIBLIOGRAFIA
A Construção do Real na Criança, Jean Piaget, 392 págs., Ed. Ática, tel. (11) 3990-1777
Os Fazeres na Educação Infantil, Maria Rosseti e outros, 208 págs., Ed. Cortez, tel. (11) 3611-9616
Manual de Educação Infantil, Anna Bondioli e Suzanna Mantovani, 356 págs., Ed. Artmed, tel. (51) 3027-7000
Revista Nova Escola
Olá Eduardo
ResponderExcluirGostei muito de como agir diante dos 5 mitos, principalmnte por conta das orientações profissionais de como o Educador deve agir em cada uma das 5 situações. Apesar de ainda não ter filhos e não ser pedagogo, achei bastante ilustrativo e enriquecedor, ainda mais para quem é da área e trabalhe com crianças pequenas, ou Pais angustiados que se encontram na fase descrita com filhos em idade pré escolar ou creches...
Diferentmente de Freud, não gosto da visão da criança como um polimorfo perverso ou egocêncentrica, como a de um pequeno tirano. De certo modo o seu post retrata uma nova forma de vermos as crinças como elas mesmas, sob a sua ótica, e não a de um adulto analisando uma criança, que sempre será a de uma Adulto antorpormorficamente falando, projetando caracteristicas suas ou de uma adulto, dentro de um mundo mágico... que é díferente do seu pensamento cartesiano...
Parabéns pelo elucidativo post...
Abs...
Rodrigo Marcilio